Dicas

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Se Chego a Te Beijar...

(Dedicado aos meus amigos)


Hoje me senti velho. Velho de tudo, de trajes, palavras e de cores. Um sentimento antigo me dominou, podia sentir o tempo sobre meu rosto, nos beijos que dei e roubei. Minhas canções são tão antigas. Meus livros, o mundo que criei a minha volta estava parecendo um monolito.
As coisas que me irritavam deixaram de me inquietar e viraram rotina. Tudo girava em um mesmo sentido. Até meu cigarro favorito deixaram de fabricar. Os meus melhores compositores ainda estavam em LP, mas eu já tenho em CD.
Era um dia comum, quando você surgiu. Você era a novidade, o incomum, mas tão naturalmente simples. O convite deu e tirou para me mostrar que tudo era impossível entre nós.
- Mas que conversa é essa de nós?
Recusei o convite. Meu mundo não pode sair de sua rotação costumeira, nem o bonde dos meus desejos mais cínicos e imorais podia sair dos trilhos. Você era tudo que sempre quis. O único problema é que chegou atrasado, anos. Então o que é você, tentação?
- Você é lindo, sabia?
- Sim eu sei.
- Vou te surpreender. Prometo.
- Não é a hora, nem o lugar certo. É impossível, olhe a sua volta. Você chegou na hora errada.
Um jovem de olhar doce, tão doce quanto o meu foi um dia, quando tinha menos amargor e experiência. Nesse tempo eu sabia o que desejar sem reservas. Com o tempo a gente esquece o desejo e fica com os gestos. E enquanto ele tentava me convencer eu beijava sua boca com os olhos. Tocava seu cabelo, sentia a maciez de sua face, sorria de sua juventude.
Seu convite ficou ardendo dentro de mim como fogo líquido. Foi sincero e atrevido. Ele me quer. Desejou-me como um doce na vitrine. Estudou minha vida, meus gestos, hábitos e foi sincero. Lisonjeado, sim. Sou mais velho, mais experiente e meus vícios vão intoxicá-lo, adoecer de paixão. Mil vidas, quantas vezes mais eu poderia ter alguém assim? Era um enviado da tentação, eu tinha certeza!
Veio testar minha resistência, minha idade, tudo que criei e vivi, ele queria me enlouquecer e fazer-me perder a razão em seu corpo.
O garoto vai se apaixonar e pôr tudo a perder com seu arroubo de juventude. Vai entrar na minha vida e trazer luz e fogo, um deus de prazer e pecado. Eu quero pecar, mas o inferno me assusta.
Recusei-te e fingi que nada senti, que tudo continuava girando. As estrelas haviam sumido, só restou o universo.
Bastava um chamado meu para que você caísse aos meus pés e me fizesse feliz. Mas por quanto tempo?
Conheço o corpo dele mesmo sem nunca tê-lo tocado, é igual ao meu. Sua boca, os olhos de um ser mítico. Tenho certeza, ele é doce.
O meu repúdio o enfureceu, o fez agredir-me, tolo, será que não percebeu que não posso mais ser ferido?
O acalmei, o fiz entender que era impossível. O mundo precisa continuar girando, os Deuses no céu e os mortais na terra. Não me senti poderoso quando o fiz sofrer com minha recusa. Só percebi que o tempo estava passando e eu havia virado o desejo de alguém.
E se chego a te beijar não ficaria mais jovem, nem mais velho, eu só me apaixonaria.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ui!
Me lembrou os arroufos de Julien Mayfair com as menininhas (a maioria filhas dele mesmo).

Amei.
Acho q velhice não é sinonimo de morte, talvez existam muitos idosos mais atentos do que nossos jovens alienados.
;*

Nazarethe Fonseca disse...

De fato uma daquelas historias proibidas e saborosas,que incluem todos nós pobres mortais.
bj